sexta-feira, 24 de abril de 2009

Entrevista com Elias José...eterno em suas obras.

Entrevista realizada no ano de 1999 no CESC/UEMA em Caxias – Ma, durante o encontro do PROLER.
Entrevista com Elias José
Lila Léa – Professor Elias José, nós gostaríamos de falar um pouco sobre você, então, fale-nos um pouco de sua obra, sua vida.
Elias José – sobre minha obra e minha vida acho que dá pra fazer uma conferência, porque eu tenho 63 anos, já vivi muito. Minha obra é extensa tem 68 livros, acho que antes de terminar o ano eu já completo os 80, já vai sair mais duas obras, dois refabulando. É o seguinte, eu escrevo para adulto, escrevo para crianças e escrevo para jovens, eu comecei a escrever para adulto os 4 primeiros livros. Eu tenho 6 livros de contos, tenho 2 romances e um livro de poemas, ganhei inclusive o Prêmio Jabuti com um livro de contos, e mais, cada vez eu vou escrevendo menos para adulto e mais para crianças , vou me envolvendo mais talvez por estar envolvido com muitos projetos ligados a escola. Eu gosto mais de escrever para adultos, para crianças aliás, gosto muito mais que escrever para adultos, o mundo dos adultos está meio pesado, o mundo da criança é mais leve, mais solto.

Lila Léa – O que o senhor acha da utilização da poesia em sala de aula?
Elias José– Eu acho uma coisa renovadora e bacana, quer seja a poesia entrando na substituição das velhas cartilhas e na substituição de textos gastos que não dizem nada pro universo da criança, sobretudo da poesia brincalhona, poesia lúdica, não aquela poesia antiga, formativa que queria só ensinar bons modos por menino, amar a pátria, amar a mãe, amar é..., ser educado, dar bom dia, boa tarde, falar sobre trabalho, a árvore. Não que não seja necessário cuidar destes temas, mas eu acho que a poesia não é hora pra isso, a poesia é brinquedo com as palavras.

Lila Léa – Como o senhor acha que deve ser o trabalho com a poesia em sala de aula?
Elias José – Primeiro deve haver um trabalho muito grande de brinquedo com a palavra, que a palavra seja muito brincada, muito sentida, para que a gente descubra as cores da palavra, vê as palavras alegres, as tristes, as palavras velhas, as novas, a palavra gelada. Se por exemplo tem diferença né , ciúme, a palavra toda, vermelha tipo guerra , carnaval, amor, paixão. Então ir brincar para que eles sintam a idéia da palavra, a divisão de uma palavra, em outras, tirar palavras, até do próprio nome deles. Então eu acho que o primeiro trabalho é esse gosto pela palavra. Uma coisa que o menino gosta também é reler modificando o texto recolocando rimas, colocando novas rimas, então eu acho que é sempre um ato lúdico sempre cuidar do lúdico do poema infantil, fazer ele, brincar com as palavras pra sentir que isso é possível ser gostoso.

Lila Léa – Quais os conselhos que o senhor daria aos professores que adotarem a poesia em sala de aula para desenvolverem atividades.
Elias José – Primeiro conselho, eu acho meio esquisito, vamos dizer o que eu penso que deva ser, aí fica uma coisa muito pretenciosa se dizer que eu queria dar caminho. Eu acho que a primeira coisa, o professor não deve levar para a sala de aula um poema que não leu, releu, gostou. Se ele leu, releu, gostou, ele vai saber o ritmo certo de se ler esse poema na sala de aula, ele vai saber inclusive modificar o ritmo, falar aquele poema, vai saber promover uma leitura, jogral na sala de aula, mais meninos lendo juntos, então, vai ser uma festa. Se ele gosta do texto vai ser uma festa, agora, é preciso sempre um autor bom, deixar em “platô” que essa poesia que predominou no passado hoje já não tem mais. Que essa poesia moralista, pedagógica que quer só ensinar alguma coisa que é aquela poesia brinquedo, então eu cito pra você por exemplo: José Paulo Paes, não tem jeito de não conhecer. Pedro Bandeira, não tem jeito de não conhecer, pra criança um pouco mais Roseana Murray, pra meninos maiores Bartolomeu Campos Queiroz, Carlos Queiros Teles, são autores fundamentais, eu estou esquecendo de alguns, é que a memória da gente nem sempre é muito boa, né, Maria Dinorah. Então é preciso ir atrás desses livros e você tem que gostar do poema pra levar pra sala de aula. Se você não gostou, não achou gracioso, bonito, inteligente, não leva porque você vai “amassar” o poema.

Lila Léa – Nós utilizamos muitas poesias e músicas como aquela do leãozinho “ gosto muito de te ver..” e a partir disso nós mostramos que as músicas tem a estrutura muito parecida com a poesia, e a partir disso nós trabalhamos também com músicas, então qual a sua visão disso?
Elias José - Há mais de 20 músicas colocadas em poemas meus. São 3 alunas minhas separadamente cada uma.
Desculpe, eu falei 3 alunos porque um é Adalberto, rapaz, a outra Rita de Cássia e a outra Valéria Samara. Eles colocaram músicas e disseram que não tiveram a mínima dificuldade de colocar música no poema, porque o poema já é a música, o poema já é musical. Eu passei, por exemplo, um poema com vocês a pata, pedindo pra cada um fazer porque eu tenho certeza que vai sair, senão, eu não pedia uma coisa que seria um exagero. Então a própria criança pode criar a música para o poema. Tem um pagodeiro, um poema meu pagodeiro, que tem no livro “segredinhos de amor”, eu já ouvi no país inteiro criança cantar esse poema como conta a 1ª estrofe, como aquele, não sei se você conhece: “ lá vem o Ju-ca-cá, de perna tor-ta-tá, dançando val-sa-sá, com marico-ta-tá”... aí eu fui fazendo rock, bolero, e tanto ritmos mais, baião, samba...


Lila Léa - Como o senhor definiria leitura, produção de texto e poesia?
Elias José - Leitura pra mim é uma coisa muito ampla, eu acho, por exemplo, que agente tem que levar um menino a ler-se, conhecer sua realidade, a ler seu interior, a ler o seu físico, a ler o colega, ler o corpo do outro escrever, ver a roupa do outro escrever, ler os olhos, ler a realidade da escola e escrever, ler o quadro de pintura, ler um selo, ler um mapa e aí também ler um texto literário mais não é a única leitura ao texto literário, ao texto do livro didático, ao texto de escola. Eu estou falando em ler os vários textos da vida, cores, cheiros nas formas das coisas. Então pra mim leitura tem sentido amplo. A produção de texto eu acho que tudo deve levar a produção de texto. Você pode contar uma história e dizer assim: escreva alguma coisa sobre esse texto, pode recontar o texto, pode fazer uma apreciação, pode contar a parte que mais gostou, pode falar que não gostou mais exija o por quê. Então eu acho que a escola tem que ta toda produzindo texto em qualquer disciplina, não só em língua portuguesa não, porque é lendo e produzindo que eles vão dominar a língua portuguesa. Não é com gramática, nem abrindo e fechando dicionário. Dicionário agente abre e fecha na hora que precisa dele. Poesia, também eu acho que deve ser ação da poesia da vida, a poesia que há na natureza, nas flores, nas árvores, nas plantas, no cosmo, no amanhecer, no anoitecer, na noite de lua cheia, no arco-íris, na chuva que cai, também o contrário na falta de chuva, no calor, no frio, nos elementos da poesia da realidade. Pra depois ele aprender que tudo que o poeta pôs no poema não é nada mais do que uma leitura do mundo, também dentro do ponto de vista poético, assim sim, transformado em palavras.

Lila Léa - Bem, dentro da nossa proposta, nós trabalhamos com várias poesias suas, quando nos demos conta lá estava o Elias José em quase todas as atividades, em quase todas as aulas, embora nós não tivéssemos acesso a alguns livros, então eu queria que o senhor dissesse intimamente como se sente tendo sido abraçado com tanto amor pelas crianças, nós trabalhamos com 4ª e 5ª série em toda nossa proposta.
Elias José - Olha, pra mim eu estou vivendo assim numa fase muito encantada da minha vida de escritor. A minha vida de escritor pra adulto foi uma vida até certo ponto intelectual demais, entendeu? Fechada demais, sofisticada demais, aquele ponto muito elaborado, aquela coisa de leitura mesmo, então, à medida que eu tomei a literatura infantil como um brinquedo que eu poderia brincar, ser menino outra vez e eu vi que as crianças aceitaram isso, e as crianças do Brasil inteiro. Bem meus livros esgotam facilmente, eu tenho quase 2 milhões de livros vendidos, isso tudo é muito bom. Interessante que eu tenho histórias também, muitas histórias, aliás, tenho mais livros de história que de poesia, mas quase sempre as crianças preferem mais poesia. Quase todo livro didático que se abre hoje tem uma poesia minha. Isso me encanta porque eu não fiz pra gravar na minha gaveta, eu sou vaidoso. Eu fiz pra poder mostrar, eu tenho vaidade, eu tenho orgulho desse trabalho que eu escolhi, quando a gente escolhe o trabalho e ele deu certo, maravilha, né? Vamos soltar foguetes, dá viva, rezar pra durar.

Lila Léa - Eu gostaria de deixar registrado aqui nossa mesma gratidão e certeza de que o senhor melhorará cada vez mais e venderá cada vez mais livros, e dizer que estamos mais apaixonadas pela sua obra. Obrigada.
Elias José - Obrigado vocês também, sucesso pra vocês, espalhem bastantes poesias. E que leitoras passem a ser produtoras também de poesias, como aconteceu no livro “a troca da lógica”... que ela conta experiências de criança que brincava com livro e um dia ela brincou também de produzir livros.

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